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No ano seguinte, Pitty dá prosseguimento a participação dos grandes festivais que acontecem de norte a sul do país. Ela participa novamente das edições do Planeta Atlântica no RS e no Festival de Salvador. Ainda marca presença na edição do Ceará Music. Além disso, é convidada para participar num festival internacional, o Rock In Rio in Lisboa onde ela divide o palco com grandes nomes do rock como Red Hot Chilli Peppers e Roger Waters.
Quanto aos clipes, ela despeja mais dois do ábum "Anacrônico". O primeiro foi "Memórias" que ganhou o prêmio de melhor clipe do Prêmio Multishow de Música Brasileira e o segundo é "Déjà Vú". Aliás, em termos de premiações, 2006 também foi um ano generoso com a Pitty. Depois de ganhar prêmios no Multishow e no canal Nickdleon, ela fatura vários outros no VMB. São eles: Melhor Clipe de Rock, Melhor Site, Banda dos Sonhos (de novo) e o principal da noite, a Escolha da Audiência. De fato, outra noite emocionante e inesquecível para todos nós.
Desde a infância em Porto Seguro que ela tem seus ouvidos atentos àquela música de potencial subversivo e transformador. Começou com uma fita do conterrâneo Raul Seixas que o pai músico, tocava no seu bar. Passou pelos Beatles e Elvis, ouvidos em casa pela mãe. E chegou aos decibéis do Faith No More, Nirvana eMetallica, contrabandeados com algum inevitável atraso para Porto Seguro por amigos, justo quando ela entrava na adolescência – fase crítica e decisiva, em que começava à alçar vôo na vida. Pitty se lembra bem: “aquela música casou com meu estado de espírito na época. Eu estudava em escola particular e não tinha luxo em casa. Via as meninas com roupa de grife e não entendia como a imagem poderia ser algo tão importante. Isso me levou a me questionar e me convencer de que o melhor é ser eu mesma”.
Década e tantos depois, a convicção ainda está lá em Admirável Chip Novo. “Ninguém merece ser mais um bonitinho”, canta Pitty em “Máscara”, uma das faixas mais pesadas do disco, digna de um álbum do Helmet. Bonita como uma estrela teen, mas com tatuagens, piercings e vestidos pretos que dariam muito assunto num papo com Phil Anselmo, a cantora se sustenta no cenário com som, atitude e discurso. Forma econteúdo se unem no trabalho dessa pequena notável (Pitty foi o apelido que a menina Priscila ganhou por causa da estatura), disposta a mostrar que o tabuleiro da baiana tem muito mais coisas do que a nossa vã imaginação poderia sacar.
Na adolescência em Salvador, a espevitada cantora integrou a banda de hardcore Inkoma, que lançou fita demo, participou de coletâneas e lançou no ano de 2000 o CD Influir. “E o que impressionava não era o fato de eu ser menina, mas o nosso som, que era muito tosco. É claro porém, que rolavam algumas piadinhas”, diz Pitty, que se beneficiou de uma cena roqueira que na época abria brechas no sufoco axé de Salvador, de bandas como Lisergia, Dois Sapos e Meio. The Dead Billies e Brincando de Deus.
Mas como tudo na vida, o Inkoma acabou. Atropelada pelos acontecimentos, Pitty foi a luta. Aprendeu a tocar violão, foi estudar música na escola da Universidade Federal da Bahia (onde Tom Zé, em outros tempos, teve suas lições de música atonal com o maestro Hans-Joachim Koellreutter) e começou a compor. As letras vieram dos diários que mantinha desde a infância – com eles, por sinal, que ela começou a se alfabetizar. Sem a menos das expectativas, numa tarde vazia, Pitty recebeu um telefonema do produtor Rafael Ramos (de discos de Los Hermanos, Raimundos, João Donato, Vídeo Hits, entre outros), que era um dos sócios da Tamborete, selo que lançara o disco do Inkoma, informado de que ela compunha para um possível trabalho solo, Rafael pediu uma fita com as músicas em voz e violão. E o resto... o resto ainda há de ser história.
Para gravar Admirável Chip novo no Rio, nos estúdios Tambor, sob o comando de Rafael, Pitty carregou dois dos melhores músicos de Rock de Salvador: o guitarrista Peu (do Dois Sapos e Meio) e o baterista Duda (do Lisergia), que tiveram até um grupo juntos, o Diga aí Chefe. Com punch e categoria instrumental, eles ajudaram a cantora a moldar aquilo que define como “um apanhado sonoro” de tudo que ouviu na vida. “Teto de Vidro” (“quem não tem teto de vidro que atire a primeira pedra”) abre o disco com pulsação mental, indignação punk e uma feminilidade que irá surpreender muita gente. Sem refresco, entra em seguida a também faixa-título, que Pitty não esconde, é mesmo inspirada pelo livro Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, um dos escritores favoritos dessa rata de sebo fissurada por ficção científica. Bombardeada de manhã cedo na internet por todo tipo de mensagem publicitária, Pitty anteviu um mundo em que as pessoas haviam se tornado robôs – só ela era capaz de ver a verdade sobre a dominação, como se fosse herói do filme Matrix. Já o filósofo inglês Thomas Hobbes é a referência de outra pedrada do disco, “O Lobo” (“o homem é o lobo do homem”). E um conto de Edgar Allan Poe, sobre a possibilidade de se fazer parar o tempo, deu a partida para a épica “Temporal”, faixa que acabou ganhando uma roupagem a altura de suas intenções: violoncelo de Jacques Morelembaum, violão de Moska e violino de Ricardo Amado, num arranjo cheio de arabescos de Jota Moraes, que não deixa nada a dever a um “Disarm” dos Smashing Pumpkins ou mesmo “Kashmir” do Led Zeppelin.
Apesar de estar cheio de músicas fortes, como “Só de Passagem”, “Semana que Vem”, “Emboscada” e “Do Mesmo Lado”, Admirável Chip Novo abre espaço para Pitty se aventurar numa power balada, “Equalize”, que teve a participação do mutante Liminha no baixo, (nas outras faixas, o instrumento foi tocado pelo onipresente Dunga). Mais uma vez, surpresas: diferentemente de um exemplar comum desse gênero popularizado por Kiss, Scorpions e Bom Jovi, o romantismo não é sinônimo de baba. Ao contrário: o componente mais forte na música é o erótico, expresso em delicadas metáforas. “Não fiz uma música sobre amor, mas sobre sexo”, entrega Pitty. Algo que certamente Avril não escreveria por conhecer ainda pouco da vida, e Alanis por estar mais preocupada em ser zen. Mas Pitty, como de costume, não está nem aí para as comparações. E nem pensa muito no futuro, bem ao estilo Kurt Cobain – o que importa é que o trabalho está feito. “Tudo pode mudar. Eu pulei do penhasco e não sei se o pára-quedas vai abrir. Mas se não abrir, também, tudo bem,” diz. |
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